Viu no espelho aquelas palavras reflectidas. Agora faziam sentido:
“mais vale perder a vida que a perder a alma e arder no inferno”
Aquilo estava certo, estava realmente condenado, mas ainda podia tentar salvar a sua alma. Tinha tudo o que precisava para o fazer, só tinha de sobreviver até lá. Saiu do apartamento ao mesmo tempo que colocava aquela adaga novamente no bolso do casaco como havia feito há tantos anos atrás. Pensou em ir pelas escadas, mas tinha que ir pelo elevador para chegar ao seu carro. Entrou no elevador e carregou no botão que dava para a garagem e fechou os olhos com força, não queria ver aquela sombra novamente. Mesmo de olhos fechados ouviu sons tenebrosos, como se os cabos do elevador fossem partir, mas não teve coragem de abrir os olhos. Saiu do elevador quase a correr e entrou no seu Toyota celica. Saiu da garagem, e acelerou. Não havia nenhuma igreja próxima dali. Começou a pensar em todos os erros que cometeu, em tudo o que fez e sacrificou para nada. Então viu a sombra de olhos vermelhos a “sorrir-lhe” num carro que vinha na direcção oposta. “tem calma” pensou enquanto olhou distraidamente para o lado direito. Saltou de susto quando o fez, viu uma criança totalmente carbonizada, viu aquela criança do seu sonho novamente. Olhou repentinamente para o outro lado, aquilo não era real, mas quando viu o seu reflexo viu o olhar do amigo que morrera no carro. Nesse momento embateu estupidamente nos rails de protecção e capotou espalhafatosamente dando várias piruetas no ar. Bateu com a cabeça várias vezes no volante e no vidro da janela e desmaiou.
Acordou no carro virado ao contrário, estranhamente o carro estava intacto, apenas ele estava bastante magoado. Abriu a porta do carro, tirou o cinto e caiu para fora do carro. A rua estava deserta e tudo parecia a preto e branco. A única cor que via era o vermelho do seu sangue. Tinha de continuar até à igreja e tentar salvar a sua alma e começou a correr. Repentinamente surgiu uma corrente no ar com um gancho que se espetou na sua mão direita e o puxou para trás fazendo-o cair ao chão. Levantou-se de um salto mas a corrente começou a arrastá-lo com força. Uma outra corrente surgiu do nada do outro lado e espetou-se na outra mão. Cada uma das correntes puxava para o lado oposto da outra enquanto ele se debatia para se libertar. Olhou para o chão enquanto se esforçava por puxar aquelas correntes que se lhe prendiam à carne e viu que este estava coberto de vidros e que ele próprio se encontrava descalço e começava a lavar os seus pés em sangue. Duas mais correntes surgiram, desta vez do chão, espetando-se nos seus dois tendões de Aquiles fixando-o. O chão começou a aquecer enquanto que o céu gelou. Uma chuva gélida começou a cair sobre ele enquanto que o chão lhe queimava os pés. O tecido da sua roupa começou a desvanecer-se aos poucos, assim como a sua esperança e força de viver. Tentou gritar mas nenhum som saiu da sua boca. Um longo trovão suou e nesse instante a chuva parou, o chão deixou de queimar e as correntes rasgaram-lhe a carne libertando-o. Caiu ao chão, para cima dos milhares de vidros ali espalhados que se acabaram por espetar na sua carne. Aquelas feridas eram bastante dolorosas, aquilo quase parecia o inferno, aliás, o inferno não poderia ser assim tão mau. Mas não podia desistir, tinha que se por de pé e continuar, e foi exactamente o que fez. Levantou-se e caminhou por cima dos vidros que não sabia sequer de onde vinham, cada passo que dava era tão doloroso que quase desejava morrer apenas para poder parar. Esforçava-se por manter os olhos abertos e não desmaiar, mas era difícil com tantas lágrimas e sangue a brotarem dos mesmos. Mais alguns passos e deixaria de caminhar por cima daqueles vidros. Todo o seu corpo doía, já tinha dores pelo acidente mas todos aqueles vidros minúsculos a espetarem-se no seu corpo sem roupas era realmente doloroso. Apenas mais um passo o separava de um chão de areia fina, mas então uma sombra surgiu e embateu nele jogando-o para o chão de costas, mas esse chão já não existia, havia dado lugar a uma piscina com álcool. Tentou gritar mas quando abriu a boca nada saiu, apenas entrou álcool que o queimava por fora e agora também por dentro. O álcool daquela piscina rapidamente ganhou uma tonalidade avermelhada pelo excesso de sangue que provinha do seu corpo. Esforçou-se por vir à superfície, mas uma corrente trespassara-o a meio dos rins e prendera-o ao fundo. Abriu os olhos por um segundo, mas estes queimavam com o álcool. Mas um segundo foi suficiente para discernir dois vultos à superfície da piscina, uma sombra negra com uns olhos vermelhos e uma silhueta de mulher. Sentiu o álcool aquecer a sua volta, à medida que este aquecia parecia queimar ainda mais. Então ouviu uma voz bastante familiar dizer.
-Não, ainda não.
Repentinamente a corrente que o prendia soltou-se e ele saiu daquela piscina. Mal chegou a superfície saltou logo de lá de dentro ficando debruçado a vomitar álcool e sangue. Abriu os olhos, mas mal conseguia ver. Estes começaram a chorar sangue em vez de lágrimas. Todo o seu corpo gritava de dor. Deixou-se cair no chão, não aguentava mais. Começou a sentir cócegas, mas não eram nada agradáveis, dois segundos depois essas cócegas deram lugar a umas dores insuportáveis para juntar às que já tinha. Levantou-se de um salto e tentou sacudir-se, mas de nada lhe adiantou. Olhou para algumas das suas feridas e viu bichos enormes a entrarem-lhe pela carne. Gritou, gritou tão alto quanto conseguia, ate cuspir sangue e quase rasgar as cordas vocais, logo se apercebeu que fora um erro gritar daquela forma pois enquanto gritava vários insectos e talvez ate um ou outro réptil entraram pela sua boca começando a come-lo pelo estômago. Uma luz acendeu perto dele e chamou-o à atenção. Olhou e viu Grinmord com uma chama na palma da sua mão.
-Espera só mais um bocadinho. – Disse uma mulher que se encontrava ao seu lado.
A mulher aproximou-se dele e espetou-lhe dois estalos que lhe arrancaram parte da cara.
-Eu estava grávida! – Gritou por entre lágrimas. – Agora arde! Arde no inferno!
A sua mulher pegou numa chama que tinha sido atirada por Grinmord e atirou-lha para os pés, ao mesmo tempo que um corvo lhe arrancava os olhos com o seu bico afiado. Num segundo todo o seu corpo se encontrava em chamas, queimando também o corvo que ainda se encontrava próximo da sua cabeça. Caiu ao chão em agonia, mas estava ensopado de álcool, por fora e por dentro e as chamas não abrandaram nem por um segundo.
Abriu os olhos dentro do carro. Tinha sido apenas um pesadelo, muito real por sinal, ainda tinha todas as dores. Saiu do carro que estava ao contrário, e caminhou na direcção da igreja. Já estava perto, já a conseguia ver ao longe. O trânsito havia parado por causa do seu carro virado ao contrário e muitas pessoas lhe perguntavam se estava bem mas ele não ouvia o que diziam, apenas tinha de chegar à igreja, tinha de acabar com aquilo. So tinha de atravessar a estrada, então viu-a novamente, a sua mulher. Deu um passo em frente mas logo deu outro atrás e em menos de um segundo um grande camião passou. Quando este saiu da sua frente a sua mulher já lá não se encontrava. Atravessou a estrada e chegou à entrada da igreja. Entrou, a igreja estava cheia. Estavam a rezar uma missa pelas almas condenadas. Dirigiu-se ao altar, onde estava uma pia com água benta. Toda a gente se calou com a sua presença no meio da igreja, nem o padre se atreveu a dizer nada. Quando se aproximou do altar o suficiente, tirou a adaga manchada com sangue de uma criança inocente e lavou-a na pia.
-Perdoe-me padre que eu pequei.
Foram as únicas palavras que proferiu dentro da igreja e antes de erguer a adaga e a espetar no seu peito em frente a todas aquelas pessoas. Vários gritos foram ouvidos pelos espectadores que também gritavam, várias sombras voavam dentro da igreja em volta do corpo ensanguentado. As sombras começaram a entrar no corpo, enquanto que algumas pessoas se benziam, e outras fugiam. Do nada apareceu uma sombra mais opaca que todas as outras, uma sombra com os olhos vermelhos.
-Hum… nah, não me parece bem, essa alma é minha!
Subitamente as sombras pararam de entrar no corpo sem vida daquele condenado, e o corpo ergueu-se no ar brilhando com tons laranja como o fogo. Os seus olhos pareciam ter desaparecido dando lugar a duas bolas de fogo. Então saiu algo prateado do corpo, mantendo sempre uma pequena ligação com este. Nesse momento as sombras voltaram a entrar no corpo e a luz que o preenchia começou a ficar mais forte e viva, ficando num tom de vermelho cor de sangue. A alma ficou parada entre Grinmord e o novo espectro ainda tendo uma ligação com este último.
-Nos somos Frearlord. Por me terem despertado irei-vos conceder os vossos desejos. Mas aviso que sairão bastante caros.
-Podias por começar por me devolver esta alma que me pertence. – Ordenou simpaticamente Grinmord apontando para a alma entre eles.
-Pois... quanto a isso nada poderei fazer, foi o dono desta alma que me trouxe, apenas desejando não ser teu, e sacrificou-se, por isso, a sua alma é mais que minha.
A alma voltou para o seu corpo de origem dando um último toque energético ao espectro.
-Dá-me essa alma!
-Não me parece…
A maioria das pessoas já havia saído da igreja mas algumas ainda não, como o padre e alguns idosos. A igreja fechou todas as portas e entrou em chamas. Os dois espectros atiraram-se um ao outro tentando por tudo destruir-se. As pessoas que se encontravam na igreja começaram a correr de um lado para o outro em chamas, tirando um idoso que morreu automaticamente e outro que apenas rebolou no chão antes de perecer. Assim que as pessoas morreram as suas almas foram direccionadas a Frearlord que as usou para ficar mais poderoso. Ambos os espectros se afastaram, Grinmord lançou uma bola de fogo à cara de Frearlord para o ofuscar e prendeu-o com uma corrente em chamas que desfez o seu corpo e o fez desaparecer dali. Frearlord apareceu atrás de si, pegou na sua cabeça e carbonizou todas as almas do seu corpo. Então um espírito surgiu e espetou a adaga de prata lavada em agua benta nas costas de Frearlord.
-Posso não te matar, mas todas as almas do teu ser irão sofrer para toda a eternidade! – Disse a mulher que fora condenada pelo marido antes de desaparecer em chamas.
O espectro cuspiu algo que para ele seria equivalente a sangue. Mas logo ficou bem.
-As minhas almas podem estar a ser torturadas, mas isso de nada me afecta. – Sussurrou. – todas elas estão condenadas a um inferno muito pior que o dito normal, mas isso só irá acontecer com o meu desaparecimento…
es mau! nao vale nao dar um fim concreto a historia!
ResponderEliminarNão o podia fazer de outra forma XD
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